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  • 23 de novembro de 2020

Padre Fabiano | Todas as vidas negras importam

Padre Fabiano | Todas as vidas negras importam
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Manifestação contra o racismo aconteceu em Gravataí.

Diante da repercussão da minha última coluna, sobre o assassinato do João Alberto no Carrefour no último dia 19 de novembro, resolvi continuar refletindo sobre o assunto. Inclusive, houve um leitor que utilizou uma sigla que estou ainda tentando decifrar: “Padre, VTNC”. Acredito que seja “Padre, Valoroso Texto Nos Conscientizou!” Senti-me lisonjeado e agradeço a honraria!

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Lendo alguns comentários à coluna e percorrendo outras redes sociais, vi que algumas pessoas esmeram-se em levantar a ficha criminal do João Alberto, e fizeram comentários do tipo: “não morreu de graça.” Então, sua ficha criminal minimiza o excesso de violência usado contra ele? Teriam os dois seguranças feito justiça, ao eliminar um pária da sociedade, e deveríamos dar-lhes uma medalha por bravura, talvez nomeá-los heróis de Porto Alegre?

Assisti novamente as imagens, para ter certeza que não me enganei. Vi uma cena de barbárie, vi uma violência desmedida e desproporcional utilizada contra um ser humano, vi um joelho num pescoço tirar o oxigênio de um ser humano até ele sufocar. O mesmo aconteceu à época da morte de George Floyd, nos Estados Unidos. Houve uma tentativa de amenização da situação com a divulgação da ficha criminal de Floyd, e com a alegação de que ele resistira à prisão.

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A delegada que investiga o caso encontrou um vídeo no qual aparece João Alberto iniciando a agressão, desferindo um soco contra um dos seguranças. Não sabemos o porquê, talvez tenha sido provocado com injúrias raciais. Não sabemos e talvez nunca saibamos. Partindo do pressuposto de que ele teria provocado os seguranças, que teria de fato agredido alguém no supermercado, a pergunta continua: a resposta foi agressão até à morte? Os dois “seguranças” tomaram para si o papel de juízes e executores da sentença.

A polícia está descartando a motivação racial para o crime. Isso não diminui em nada a brutalidade do crime, nem a necessidade da discussão do problema do racismo no Brasil, no que discordo do vice-presidente, que afirma não existir racismo no Brasil.

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A morte do João Alberto, tendo sido por motivo racial ou não, deu o start para uma ampla discussão acerca desse problema secular em nossa nação, a discriminação por motivo étnico, a desigualdade social motivada pela cor da pele, o preconceito racial. É um debate ainda em andamento, com posições por demais acirradas e divergentes. Contudo, é um debate necessário num país plural e com histórico de mais de 350 anos de escravidão.

Mas, temos que ampliar o olhar. A morte do João Alberto despertou um forte movimento antirracista em todo país. Protestos em frente às lojas do Carrefour, inclusive com registros de depredação. Repudio todo e qualquer ato de violência, não compactuo com depredação de patrimônio, até porque os trabalhadores do Carrefour, muitos negros, inclusive, não têm culpa do que aconteceu em Porto Alegre, e que, num possível fechamento dessa loja, ficarão sem seus empregos, perderão o sustento de suas famílias.

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Os protestos que vimos na última semana assemelham-se ao Black lives matter norte-americano. Toda e qualquer manifestação pacífica é legítima. Os movimentos negros devem se organizar e lutar pelo fim do racismo, pela igualdade de oportunidades, e pelo fim da violência contra os negros, contra todos os negros.

Poderíamos pensar em acrescentar uma palavra ao lema: All black lives matter. Todas as vidas negras importam. Penso agora em tanto policiais negros mortos no cumprimento do dever. Dois em cada três policiais  assassinados no Brasil são negros. Seriam assassinatos por motivo racial? Foram vítimas da violência que tentavam combater. Não me recordo de ter visto protestos pelo assassinato desses homens e mulheres negras. Eram negros, portanto, o movimento negro deve olhar por eles também.

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Por fim, penso que temos um problema de humanidade. Nos falta consciência de humanidade. A escravidão, o preconceito, a discriminação, a violência acontecem porque se perde o senso de pessoa, de humanidade. Escravizar é tornar “alguém” em “algo”, é coisificar o ser humano. Discriminar, preconceituar, violentar, matar, também.

Negros são discriminados, índios são discriminados, cristão são discriminados em alguns países, muçulmanos em outros. Negros, índios, cristãos, muçulmanos, são seres humanos antes de serem negros, índios, cristãos ou muçulmanos.

Não há judeu nem grego, escravo ou livre, homem ou mulher; porque todos vós sois um em Cristo Jesus.  E, se sois de Cristo. (Gl 3, 28-29). Deus criou a todos iguais, somos todos pessoas diante de Deus, não importa nossa etnia. Por isso, digo que nos falta consciência de humanidade. Precisamos recuperar logo essa consciência, ou veremos coisas piores acontecerem.

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