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  • 4 de maio de 2020

Padre Fabiano | O Padre e o Presidente

Padre Fabiano | O Padre e o Presidente
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Papa Francisco e Padre Lucas foram atacados por receberem Lula e Bolsonaro, respectivamente. Fotos: Divulgação

 

Na última quinta-feira, a Arquidiocese de Porto Alegre se viu envolta numa polêmica político-partidária, travestida de preocupação sanitária. Por ocasião da troca do Comando Militar do Sul – saiu o General Geraldo Antônio Miotto e foi empossado o General Valério Stumpf Trindade – estiveram na capital dos gaúchos o Presidente Jair Bolsonaro, e  seu vice, o também General Hamilton Mourão. A sede do CMS fica na Rua dos Andradas, centro histórico de Porto Alegre, em frente à Igreja Nossa Senhora das Dores, a mais antiga de Porto Alegre – sua construção teve início em 1807 – e também uma das mais bonitas.

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Ao final da cerimônia, o pároco da referida paróquia, Pe. Lucas Matheus Mendes, filho da nossa Gravataí – por coincidência, filho da paróquia onde atuo – estava na escadaria da igreja, observando de longe a saída da comitiva do presidente, quando foi chamado por um dos generais presentes para conhecer o presidente, cuja assessoria de imprensa sugeriu que fosse tirada uma foto com o padre na escadaria da igreja – tanto as fotos quanto os vídeos estão nas redes sociais. O que segue daqui pra frente me foi narrado pelo próprio Pe. Lucas, meu amigo pessoal. Bolsonaro disse que agradecia a Deus pela sua vida após o atentado, e pelo fato de conseguir ser presidente. O padre lhe presenteou com um terço, uma bênção, e em retribuição recebeu um abraço. Fim.

Ao contrário, início. Início de uma verdadeira campanha de desconstrução da sua imagem, com ataques, ofensas e dúvidas quanto à sua fé ao seu sacerdócio. Em muitos desses textos de crítica, muitos com tom raivoso, diria até com discurso de ódio – o que por si já penso ser um tanto quanto incoerente, pois, segundo estes mesmos, quem tem discurso de ódio é o presidente, o que me faz questionar: ele não pode, os outros sim? – o acento estava no fato de nenhum dos dois estar utilizando máscara, no abraço que trocaram e na falta de distanciamento. Eu até concordaria, se não tivesse observado bem o perfil de alguns dos autores das críticas, e notado um ponto comum em todos eles: o alinhamento ideológico com a esquerda.

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Fiz então outro questionamento: o problema foi o não uso da máscara ou a acolhida a Bolsonaro? E sim, vi que em muitos desses textos de ódio ao padre, estava explícito uma repulsa pelo fato do padre ter acolhido o Presidente, ter lhe abraçado, ter lhe dado um terço de presente. O problema estava na acolhida, pois, “a Igreja não pode abençoar fascistas”, “padres tem que ficar longe de genocidas”, “Bolsonaro é o anticristo”, “não pode acolher”, etc.

Lembrei então de outra cena, semelhante, ocorrida ano passado, que também viralizou e polemizou: o ex-presidente Lula sendo recebido no Vaticano pelo Papa Francisco e abençoado por ele. Lembro bem do que disseram: “papa comunista”, “papa vermelho”, “anti-papa”, “sedevacante”, etc. Disseram que o Papa não poderia ter acolhido Lula, não deveria tê-lo recebido. Tanto o Papa quanto o Pe. Lucas foram acusados de alinhamento ideológico com as pessoas que receberam; sobre o Pe. Lucas chegaram a dizer que ele fazia “politicagem” nas ruas de Porto Alegre.

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Vamos de novo aos fatos: Jair Messias Bolsonaro é, gostem ou não, bom ou ruim, um Chefe de Estado, eleito democraticamente num processo eleitoral democrático. A ele se devem honras de Chefe de Estado, e esse Chefe de Estado queria tirar uma foto na escadaria da igreja da qual o Pe. Lucas é o pároco? Deveria ele negar? Ser mal-educado e negar? Ele não deveria ter dado o terço, ou não ter abençoado? Lula não deveria ter sido abençoado?

Para responder essa pergunta, vou recorrer a um personagem histórico que, na sua época, também foi injuriado pelo “tipo de gente” com quem andava; foi até condenado à morte por isso. Estou falando de Jesus de Nazaré. Ao longo de sua vida, ele fez uma clara opção preferencial pelos pobres e demais pessoas que viviam à margem da sociedade: moradores de rua, deficientes físicos, e pecadores, incluindo aqui criminosos.

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Um dos seus primeiros discípulos foi Mateus, o cobrador de impostos, que estava na coletoria de impostos quando foi chamado pelo próprio Jesus para segui-lo, indo depois jantar em sua casa, onde estavam outros cobradores de impostos. Essa classe, os cobradores de impostos ou publicanos eram, em sua maioria, corruptos: cobravam a mais, repassando para o governo o imposto determinado e ficando com o restante. Outro discípulo, Judas Iscariotes, o traiu; tinha entre seus seguidores prostitutas, assaltantes, os cobradores de impostos já citados. E como foi criticado por isso! Quando questionado pelos fariseus e doutores da Lei, respondeu: “Não são as pessoas com saúde que precisam de médico, mas as doentes…não é a justos que vim chamar, mas a pecadores.” (Mt 9, 12-13)

Ao longo de toda sua bimilenar história, a Igreja entendeu ser essa sua missão, aproximar os pecadores de Deus, e, entre muitos erros e muitos mais acertos, cumpriu essa missão que lhe foi dada pelo próprio Jesus. Jesus fundou a Igreja para, após sua morte, sua obra fosse continuada. Assim, os padres, bispos, padres e leigos deveriam se aproximar dos marginalizados da sociedade, dos pecadores, das pessoas ditas más.

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Quando o Papa Francisco recebeu no Vaticano o ex-presidente Lula, condenado a 12 anos por corrupção, e processado por outros crimes, fez o gesto de Jesus. Quando o Pe. Lucas recebeu o Presidente Bolsonaro, que se é tão mau quanto dizem, fez o gesto de Jesus, que lavou os pés dos discípulos, inclusive de Judas, que Jesus sabia que o trairia. O que me causa estranheza é que os mesmo que acusam o Presidente de proferir discurso de ódio, proferiram palavras de ódio contra o Pe. Lucas; os mesmo que acusam a Igreja de não ser acolhedora, de discursarem a favor de uma Igreja em saída, acolhedora, aberta ao diálogo, queriam que o Pe. Lucas não acolhesse, não dialogasse, não abençoasse. Por isso digo que as críticas ao Pe. Lucas não tinham nada a ver com saúde, antes eram ideológicas.

Mas, extremistas há em todos os lados. Repudio também os textos daqueles que, em defesa do padre, também proferiram palavras de raiva e ódio, inclusive com ameaças ao bispo caso houvesse alguma forma de reprimenda ao sacerdote em questão. Foi uma defesa mais ideológica que católica, mais ao Presidente que ao padre. Estavam mais preocupados em defender seu “mito” que a Igreja. O que vimos nas redes sociais foi, na verdade, uma guerra entre a extrema-esquerda e a extrema-direita, entre bolsominions e petralhas. E isso é o que menos precisamos nesse momento.

Meu apoio ao Pe. Lucas, meu colega de turma e amigo – convivemos no seminário, somos da mesma turma, fomos ordenados diáconos no mesmo dia, e hoje sou pároco na sua paróquia de origem, por isso conheço sua índole – que foi respeitoso e acolhedor. Como diz o Papa Francisco: “Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças.” (EG 49).

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