- Especial
- 22 de maio de 2020
Padre Fabiano | A consequência mais positiva que tenho visto em tempos de pandemia é a criatividade
Desde dezembro de 2019, a palavra mais falada nos canais de notícias, nos portais de comunicação, nas redes sociais, nas conversas de bar, é: coronavírus. E, correlativamente a ela, vem isolamento social, lockdown, economia, Mandetta e Teich. Todos sabemos dos efeitos maléficos, tanto da COVID-19 quanto do isolamento social.
Contudo, percebo que quando se fala em consequências negativas do isolamento social, a palavra mais proferida é economia. Os comércios que fecharam, desemprego, recessão, aumento de preços, inflação. Tudo certo. Mas não podemos reduzir o ser humano à dimensão econômica. Tenho lido alguns artigos que falam das consequências emocionais do isolamento social, ou do lockdown em alguns países, que são ainda mais agravadas pelas questões econômicas.
Mas o isolamento de per si já nos traz consequências emocionais. Tem-se constatado um aumento dos casos de depressão e ansiedade. Não é fácil ficar confinado. Não é fácil ficar frente a frente com situações familiares das quais fugíamos no emprego ou na faculdade.
A depressão, a ansiedade e outras enfermidades emocionais advém não somente do isolamento em si, mas também do excesso de notícias negativas a respeito do coronavírus – como imagens de caixões enfileirados em horário nobre. E justamente para não ficarmos só falando do negativo, quero nessa coluna falar das coisas boas desse isolamento. Tem coisas boas?
É possível tirar coisas boas do isolamento, da falta de emprego, da falta de dinheiro e de alimento. Bom, o isolamento é uma realidade, não há o que fazer, e, enquanto houver, sem deixar de pensar nos problemas e em como solucioná-los, temos que conseguir dar um refresco para a mente, porque mente cansada, exausta, não acha solução adequada para os problemas.
A consequência mais positiva que tenho visto em tempos de pandemia é a criatividade, que é uma marca dos brasileiros. Falando do mundo eclesial, onde me insiro, temos visto muitas iniciativas para, por exemplo, a transmissão da missa pelas redes sociais, e sei que o mesmo acontece em outras denominações cristãs. Padres que outrora não tinham nenhuma intimidade com as novas mídias, sequer tinham um perfil no Facebook, renderam-se às tecnologias para poderem atender seus fiéis.
Os comércios têm se adaptado como podem, e aqui vemos mais amostras de criatividade: pubs se transformando em restaurantes, outros comércios adotando o modelo de tele entrega, ou diversificando seu ramo.
Tenho aproveitado para me dedicar à leitura momentos em que não estou atendendo os fiéis que me procuram pelas redes sociais. Tem sido um tempo frutuoso para descobrir novos autores, novos poetas, e, pasmem, tenho até me arriscado a rabiscar alguma coisa em folhas de caderno – talvez, vejam, bem, talvez um dia publique. Minha biblioteca tem sido enriquecida com Olavo Bilac, Adélia Prado, Florbela Espanca, Mario Quintana, entre outros.
Estou quase terminando de ler a saga O Tempo e o Vento! A criatividade por excelência se dá na arte e suas diversas expressões. Os artistas são almas sensíveis capazes de traduzir a realidade em música, pintura, poesia. E, por falar em poesia, quero partilhar com vocês uma poesia escrita por uma poetisa gaúcha, que tive a honra de conhecer ano passado. Patrícia Kobe, tem poemas publicados em antologias e agora lançou seu próprio livro, Universo em Verso, que teve o lançamento oficial adiado em função da pandemia. Ela, como poetisa, como alguém que tem o dom de expressar a realidade em verso, escreveu uma poesia durante a quarentena – e o título é esse mesmo, 40tena. Quero partilhar com vocês leitores uma boa poesia, de uma grande poetisa, e encerro por aqui
#40tena
É tenso
Começou o vento
Tem brinquedo espalhado
Tem prazo parado
Bocas não se beijam
Braços sem abraço
Cabeça no ar
Tentando adivinhar
O que o futuro dirá
Crê-se que virá
Tudo passa
Isso também passará
Esteja em ti
Deus está aqui.