- Especial
- 25 de janeiro de 2022
Amon Costa | Dos Açores à Aldeia: 270 anos de histórias
Nove ilhas no meio do Oceano Atlântico foram descobertas em 1431 pelos portugueses. Ao longo de mais de três séculos de colonização e adaptação, os ilhéus foram construindo uma identidade particular, com costumes e tradições singulares. No século XVIII, a superpopulação das ilhas e as disputas territoriais no sul do Brasil foram as condições para que a coroa portuguesa coordenasse uma colonização para Santa Catarina em 1748 e para o Rio Grande do Sul em 1752.
As ilhas do arquipélago estão divididas em três grupos geográficos: o Grupo Oriental, composto por Santa Maria e São Miguel (sede do Governo Autónomo dos Açores); o Grupo Central integra as ilhas Terceira, Graciosa, São Jorge, Pico e Faial; e o Grupo Ocidental é constituído pelas ilhas Corvo e Flores.
Trata-se de um povo extremamente religioso, que cultua a popular festa do Divino Espírito Santo, os Ternos de Reis e as Cavalhadas. Adorna as ruas com tapetes de flores na celebração do Corpus Christi, além de praticar outros sincretismos advindos dos cristãos-novos que migraram para as ilhas (judeus convertidos ao cristianismo).
Seu isolamento em relação a Portugal continental é de 1526 km, aproximadamente, dependendo de cada localização das nove ilhas. Não só a distância, mas a adoção de tradições flamencas (hoje Holanda também conhecida como países baixos) criou um jeito de falar, com um sotaque português peculiar.
Muito se fala da chegada oficial dos colonos açorianos no Rio Grande do Sul em 1752. Segundo o pesquisador e historiador gravataiense Agostinho Martha, há registros oficiais de colonos açorianos na freguesia da Aldeia dos Anjos, como os nomes de: Manoel Pinheiro, Francisco Garcia Catarina, Josefa do Nascimento e Antônio da Terra. (Revista do Arquivo Público do RS n. 23, 1930).
Mas antes dos colonos açorianos serem trazidos de forma oficial e estratégica ao extremo-sul, há registros de sesmeiros por essas terras. Sesmarias eram porções de terras doadas pela coroa portuguesa com mais ou menos 13.000 hectares de tamanho para serem cultivadas.
O próprio nome dado à nossa freguesia da Aldeia dos Anjos em nada tem a ver com a chegada dos indígenas missioneiros mas sim, com a instalação dos primeiros colonos devotos e desbravadores que vieram de Laguna.
Como os primeiros proprietários de terras, vamos encontrar alguns portugueses, açorianos e lagunenses: como Antônio de Souza Fernando (Alvorada e Estância Grande), Francisco Pinto Bandeira e Rafael Pinto Bandeira (Canoas e Cachoeirinha), João Garcia Dutra (Passo dos Ferreiros até Morungava), Antônio Joaquim de Aguiar (Costa do Ipiranga e Sapucaia), João Lourenço Veloso (Gravataí), João Rodrigues Prates (Itacolomi), Pedro Gonçalves Sandoval (Glorinha) e Cosme da Silveira (Miraguaia).
Em 1763, no dia 8 de abril, houve chegada de mais de mil indígenas missioneiros, guiados por Antônio Pinto Carneiro no território da Aldeia, pouco menos de um mês depois da chegada, no dia 24 de abril, a cidade de Rio Grande foi invadida pelos espanhóis, espalhando gente para todos os lados do Rio Grande do Sul. Foi então, que a capital foi transferida de Rio Grande para Viamão.
Muitos açorianos acampados provisoriamente em Porto Alegre vieram para a freguesia da Aldeia dos Anjos; em torno de 400 açorianos. É oportuno lembrar que a área da Aldeia abrange os territórios do que é hoje Canoas, Nova Santa Rita, Esteio, Cachoeirinha, Glorinha, Sapucaia do Sul, São Leopoldo, parte de Novo Hamburgo e parte de Taquara.
Os açorianos que por estas bandas chegaram plantavam trigo, tabaco, algodão, centeio, cevada, milho, arroz, cebola, mandioca, cana-de-açúcar, construindo moinhos, atafonas e alambiques. Uma das novidades e adaptações dos colonos açorianos foi a criação de gado. Em pouco tempo, os colonos que eram pessoas muito simples advindas de classes populares, tornaram-se grandes proprietários de terras ou estancieiros ligados à lida do gado.
As marcas da arquitetura e organização da antiga cidade estão nas edificações que resistiram ao tempo em Gravataí, desde o século XIX. Não existe uma arquitetura genuinamente açoriana, pois vários estilos ou características se misturam nas casas e habitações mais abastadas com portais, molduras adornadas, em cores vibrantes, telhas de barro além das janelas de guilhotina com vidraças.
Uma das grandes heranças ainda presentes, passados 270 anos de chegada dos ilhéus, são os seus sobrenomes. Ache o seu sobrenome açoriano: Teixeira, da ilha de São Jorge; Ferreira, da ilha Terceira; Oliveira, da ilha Terceira; Duarte, da ilha do Faial; Azevedo, da ilha do Faial; Rosa, da ilha do Faial; Fagundes da ilha de São Jorge; Goularte, da ilha do Faial; Fraga, da ilha das Flores; Medeiros, da ilha do Faial; Barcellos, da ilha do Faial; Pereira, da ilha de São Jorge; Borba, da, ilha Terceira; Garcia, da ilha Terceira; Peixoto, da ilha do Faial; Novais, da ilha de São Jorge; Quadros, da ilha de São Jorge; Faria, da ilha do Faial; Espindola, da ilha Graciosa; Marques, da ilha de São Jorge; Vieira da ilha de São Jorge; Dutra, da ilha do Faial; Maciel, da Ilha de São Jorge; Fonseca, da ilha Terceira, dentre muitos sobrenomes (apelidos nos Açores) que compõem até hoje as estruturas familiares da grande Gravataí. Particularmente, o professor que vos escreve tem Freitas (Florianópolis), Vieira e Goulart (Viamão) como sobrenomes de antepassados açorianos.
São 270 anos construindo conjuntamente com outras culturas, as raízes mais profundas de nossa cidade e do nosso estado; ao falar de açorianos lembramos sempre da mais popular dança do RS: a dança do pezinho e dos festejos do Divino Espírito Santo. Nossa terra, nossa gente!