Os detalhes de uma rotina de agressões, fome e testes de resistência na morte de criança de três anos

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Todas as crianças quando pequenas tem algum tipo de medo. Seja ele de um objeto, de uma história assustadora envolvendo bruxas com caldeirão ou de monstros que ficam atrás dos roupeiros. Todos nós quando crianças temos algum medo. Já o de Raphael Silva da Rosa, de três anos, era real, vivo e estava sempre ao seu redor.

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Não foram poucos os depoimentos dados, tanto para a polícia, quanto para a imprensa sobre o comportamento de Raphael quando ouvia o nome de seu padrasto, Natalício Ruan da Silva, que mais tarde viria a confessar sua morte. A criança nunca o chamou de pai, sempre pelo nome, mas nunca queria repetir e quando citavam o nome de Natalício, ele chorava, por muitas vezes vindo a urinar nas calças por medo.

Com o depoimento de testemunhas, a polícia conseguiu montar o perfil de Natalício. “Psicopata e frio”. Esta foi a resposta de um policial resumindo o caso, que segundo ele, chocou até os policiais acostumados com crimes contra a vida. “Até nós ficamos chocados. Foram noites mal dormidas, ambiente pesado. Temos filhos, sobrinhos, não conseguimos nem imaginar uma coisa dessas”, contou um dos agentes.

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O inquérito na Delegacia de Homicídios foi instaurado no dia 24 de setembro, um dia após Raphael dar entrada, já sem vida a pelo menos duas horas, no PAM 24h, em Gravataí. Desde então a polícia realizou diligências e colheu o relato de parentes e amigos do casal, que no mesmo dia, já se tornavam suspeitos do crime.

Raphael vivia em uma casa pequena com o padrasto, a mãe e sua irmã de colo, no conhecido “Beco da Kaiser”, no bairro São Jerônimo, em Gravataí. Era naquele barraco que a criança convivia com o seu medo real. Os depoimentos ainda davam conta das condições, tanto da casa, quanto da saúde da criança, que se agravava a cada dia. A fome na qual Raphael passava, era a menor de suas dores, comparadas as diárias agressões que sofria por parte de Natalício.

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De acordo com a investigação da Delegacia de Homicídios de Gravataí, Natalício, que em depoimento se mostrou frio ao ver as fotos de Raphael morto, agredia ele testando sua resistência. A criança foi morta por asfixia, conforme aponta os laudos. Natalício, que 20 dias depois se aposentou à polícia, confessou o estrangulamento do enteado e afirmou ter praticado a asfixia com as próprias mãos.

As costas da criança também apresentavam ferimentos, tanto de golpes desferidos horas antes, até lesões mais cicatrizadas de semanas atrás. Raphael também apresentava uma grave lesão na região da cabeça, além da quase mutilação de sua orelha, que levanta a suspeita de Natalício ter dado diversos socos nele.

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Testemunhas também relataram que Iracema era agredida por Natalício, mas que sabia das frequentes agressões que o filho vinha sofrendo. Ainda segundo a investigação, existem as suspeitas de que Natalício testava o asfixiamento em Raphael, e que em uma de suas tentativas, após já estar ferido pelos golpes que havia sofrido, Raphael não retornou. Em depoimento, o padrasto voltou a reforçar a tese de que tinha surtos de raiva, mas segundo a polícia, a tese seria uma desculpa já que Raphael não era seu filho, e que teria ciumes do pai da criança.

Autoridades espantadas

O delegado Felipe Borba, titular da delegacia que conduziu as investigações destacou a crueldade e também a naturalidade que o acusado apresentava ao ser colocado diante dos fatos. “Foi um caso chocante, mas pela tranquilidade na qual Natalício confessou o crime. Por parte da investigação também foi feito um grande esforço afim de conseguir elementos suficientes para enquadrar o padrasto”, disse. 

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Borba terminou pontuando que o laudo da necrópsia foi fundamental para a elucidação do crime e contou sobre o indiciamento dos dois. “Depois do laudo ouvimos os familiares que nortearam a investigação. A partir disso, com todos os elementos e provas, indiciamos Natalício por homicídio qualificado e a Iracema também, e por omissão.

Para os conselheiros tutelares, que no dia do crime se dividiram entre a delegacia e o Pronto Atendimento, o crime foi considerado um dos piores já presenciados por eles que também estão, de certa forma, acostumados com os casos terrificantes envolvendo crianças.

“É um dos casos mais graves que já acompanhei. Foram todos os conselheiros acionados, nos dividimos”, disse Charles Castro, membro do Conselho Tutelar Oeste. “Foi um atrocidade, todas nós conselheiras ficamos mal com aquilo. Foi horrível, e nos chocou pela frieza do casal com aquela pobre criança”, completou a colega dele, Greicy Kelli.

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“Nem a lei do crime aceita isso”

A casa de Natalício e Iracema no beco praticamente não existe mais. Apenas a estrutura maior ficou de pé. Conforme conta os vizinhos, logo depois do ocorrido eles mesmos teriam desmanchado o “barraco” de cerca de 15 metros quadrados. O local é de difícil acesso e a precariedade chama a atenção.

Alguns brinquedos e muito lixo são visíveis no interior da antiga casa. Conforme eles, só não atearam fogo no local por conta das residências próximas, todas também de madeira. “Ninguém aceitou isso aqui. Mas não podemos fazer justiça com as próprias mãos. Ele ficou prometido aqui na vila. Aqui é assim”, disse uma moradora, que por questões de segurança preferiu não se identificar.

Ao sair do local, entre as vielas estreitas, um morador comenta de dentro de sua casa, sem sequer mostrar o rosto. “Esse cara não ia sair vivo daqui, nem essa mulher. Sorte deles que estão presos, nenhuma lei, nem a lei do crime permite isso que eles fizeram”, disse ele, visivelmente inconformado com a situação que chocou a todos. 

Natalício está recolhido na Cadeia Pública de Porto Alegre. Ele aguarda julgamento e poderá pegar uma pena entre 12 e 30 anos de prisão. Iracema está também em uma ala separada na penitenciária feminina Madre Pelletier e aguarda pelo seu julgamento. A bebê de colo, irmã de Raphael foi entregue para um tia, que está com a aguarda da criança. 

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